“No Portal
da Eternidade”- “At Eternity’s Gate”, França, 2018
Direção:
Julian Schnabel
Ao ser
rejeitado com seus quadros, os únicos de uma exposição num bar, o pintor
holandês Vincent Van Gogh é aconselhado por outro pintor, Paul Gauguin, a
procurar fazer como ele. Escolher a liberdade para ser quem ele é na verdade.
Esquecer o resto do mundo e pintar.
Sugere que
o amigo deveria ir para o sul da França, já que sempre dizia:
“- Quero
pintar a luz do sol.”
E ele vai
para Arles. Mas o frio congela o pequeno quarto, onde só seus quadros coloridos
aquecem as paredes.
Vemos que
ele monta o cavalete, a tela e pega a paleta de tintas. Olha ao redor e vemos
seus sapatos velhos e sujos sob o piso de ladrilhos. A mão na tela usa o preto,
o amarelo e o vermelho e lá estão os sapatos como ele os vê. Uma transformação
que faz pensar não só em sapatos mas, talvez, em para onde vai o dono deles. Lá
fora o vento.
Um campo de
girassóis queimados pelo frio. Olhamos pelos olhos de Vincent. E a paisagem
traz sentimentos depressivos e mórbidos à mente. Um piano toca notas
melancólicas.
Mas eis que
vemos Van Gogh transformado. É verão e ele sente a terra e a grama debaixo dos
pés. Um céu muito azul e uma aleia de plátanos altos e verdes oferece um
caminho de sombra e luz ao pintor, que leva um chapéu de palha na cabeça.
A tela, o
cavalete e as tintas ele traz às costas. Parece procurar algo. Deita-se na
grama, um punhado de terra nas mãos que ele joga sobre o rosto. Uma sombra de
angústia. De repente um sorriso. Monta a tela e começa a pintar imediatamente a
paisagem. Com rapidez frenética.
A natureza
é para onde Vincent corre para fugir de seus demônios, das vozes que ele escuta
sem compreender o que falam.
Filho de
pastor, ele também quis ser como o pai. Mas foi rejeitado pela comunidade que
não entendia os seus sermões. Então ele encontrou Deus na natureza.
A bela fotografia
de Benoit Delhomme e a câmera do diretor Julian Schnabel, ora numa posição, ora
em outra, balança e embaça para dar ao espectador uma ideia de como seria o
mundo de Vincent Van Gogh.
“- Quando
vejo uma paisagem plana, vejo a eternidade. Só eu olho assim? Sou o único a
vê-la? Mas a existência não pode ser sem razão.”
Em Arles
ninguém gosta dele. Excêntrico, louco. Jogam pedras nele.
Ele vai a
um hospício, por vontade própria. O irmão amado, Theo, vem visitá-lo.
“- Eu
gostaria de morrer assim”, diz deitado com a cabeça no ombro de Theo.
Mas o
acolhimento que ele busca é impossível. Ou quase.
Quando Paul
Gauguin (Oscar Isaacs) vem ficar com ele em Arles, parecia que tudo correria
bem. Mas não. Eram muito diferentes.
O diretor
Julian Schnabel (“Basquiat”1996, “O Escafandro e a Borboleta”2007) escreveu o
roteiro com Louise Kugelberg e o famoso Jean-Claude Carrière. Trata-se de um
apanhado de acontecimentos dos últimos anos de Vincent Van Gogh. Um filme de
sensações e epifanias logo vividas como visões de pesadelo.
William
Dafoe interpreta um Van Gogh etéreo, espiritualizado, carente e ambíguo. Não há
palavras para descrever uma mente doentia que produzia tanta beleza estranha
como defesa contra o que o atormentava.
Vincent Van
Gogh morreu aos 37 anos e nunca vamos saber de fato o que aconteceu.
“Ele amava
o amarelo, esse pobre Vincent”, disse Paul Gauguin.
“Talvez
Deus tenha me feito pintar para gente que ainda não nasceu”, disse Van Gogh.