“A Viagem de Fanny”- “Le Voyage de Fanny”,França, Bélgica, 2016
Direção: Lola Doillon
As crianças são sempre as que
mais sofrem nas guerras. Perdem os pais ou se separam deles, encontram-se em
mãos de estranhos e, mais que tudo, não entendem direito o que está
acontecendo.
Em 1943, em meio à Segunda
Guerra, na França sob ocupação alemã, famílias judias deixavam seus filhos em
internatos, onde achavam que eles estavam mais protegidos. Acima de tudo,
ninguém podia saber que eram crianças judias.
Essa é a história real de
Fanny Ben-Ami que, quando tinha 12 anos, precisou deixar a escola em Megève, na
França e seguir para a Suiça com outras crianças, inclusive suas duas irmãs
menores. O país estava nas mãos dos nazistas e os judeus eram delatados e
perseguidos.
Tudo era perigoso. Pessoas
eram presas por desconfiarem que elas poderiam ser judias. Franceses
colaboracionistas se aliavam aos alemães. O que pensar de crianças pequenas,
com papéis falsos, que tinham que decorar seus novos nomes e, principalmente,
negar que fossem judeus?
É comovente a ingenuidade da
irmã menor de Fanny que pergunta a uma certa altura:
“- Mas se ser judeu é ruim
por que somos judeus? ”
Uma criança pequena não
consegue perceber a maldade e o preconceito por trás do racismo, da inveja ou
da mera estupidez, que conduz homens a perseguir outros, seus semelhantes.
Por causa de uma série de
contratempos, Fanny (na bela interpretação de Léonie Souchaud) torna-se a
responsável pelo grupo, que passa os maiores perigos a caminho da fronteira
suíça. Ela é obrigada a amadurecer para tomar decisões das quais dependia a
vida de todos.
A originalidade desse filme é
não apenas contar a história pelos olhos das crianças mas também deixar ver
como elas precisavam ser crianças, mesmo em meio às maiores dificuldades.
Então os maiores, Fanny e
Victor, tomam conta dos menores, chamam a atenção deles mas quando é proposta
uma brincadeira, todos se deixam levar, na procura de um alívio, mesmo que
momentâneo, à tensão que se instala. Uma cena num riacho mostra bem essa
necessidade de esquecer por momentos a realidade dura que viviam.
A diretora Lola Doillon, em
seu terceiro longa, ficou conhecendo o livro que conta a história de Fanny
Bem-Ami, 86 anos e decidiu transformá-lo em um filme.
Claro que foram feitas
algumas alterações, já que não se trata de um documentário, mas nada
comprometeu a verdade da viagem que Fanny enfrentou, levando não apenas nove,
como no filme, mas 28 crianças com ela.
Para ela, o mais importante é
que o filme foi feito em memória de todas as outras crianças que também
sobreviveram, pelas que não conseguiram e por aquelas que, ainda hoje são
sacrificadas pelos conflitos dos adultos.
Lola Doillon conta que ficou
chocada quando, durante as filmagens, começaram a aparecer na TV as imagens dos
refugiados da guerra da Síria e as crianças inocentes que sofriam. Ninguém se
esquece da imagem do menino morto na praia. Era um drama contemporâneo que
ecoava o que aconteceu com milhares de crianças judias 70 anos atrás.
É algo que precisa ser
pensado para que não se repita nunca mais.
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