sábado, 17 de março de 2012

Habemus Papam



“Habemus Papam”- Idem, Itália/França, 2011

Direção: Nanni Moretti


O Papa está morto.

O féretro expõe toda a pompa do Vaticano, recriada pelo olho atento da câmara de Nanni Moretti. A procissão fúnebre é acompanhada pelos cardeais em fila majestosa. Rendas, ouro, vermelho. A guarda suíça reluz em seus uniformes medievais.

Como cenário para o conclave que elegerá o novo Papa, os afrescos sublimes da Capela Sistina, com seus preciosos mármores trabalhados e madeiras nobres.

Para a eleição do novo pontífice, cento e oitenta cardeais do mundo inteiro estão reunidos e isolados do mundo, que espera a fumaça branca lá fora, na Praça São Pedro, com sua colunata célebre, obra do arquiteto da Basílica, Michelangelo, artista maior.

Em meio a toda essa grandiosidade, o cardeal Melville (Michel Piccoli) é focalizado durante a contagem de votos. Ouvimos seus pensamentos:

“Por favor, Senhor, eu não. Não posso. Não permita que eu seja eleito!”

Ora, no mundo atual, fama e poder são ”commodities” pelas quais a maioria paga qualquer preço. Causa estranheza, portanto, um homem que as recusa. Só pode ser louco ou boçal.

E quando se trata de um Papa que, eleito, aceita o posto com um olhar angustiado e que depois se recusa a subir na sacada para saudar o povo que lota a praça... Está criado um impasse nunca visto.

Nanni Moretti, o diretor premiado no Festival de Cannes pela melhor direção em “Caro Diário” (1993) e que ganhou a Palma de Ouro por “O Quarto do Filho” (2001), realiza em “Habemus Papam” um trabalho original, com um roteiro que privilegia um humor fino e sofisticado. O riso cúmplice é preferido às gargalhadas.

Para resolver a questão da angústia do Papa é chamado um psicanalista narcisista e sarcástico (o próprio Nanni Moretti). A ironia transborda de suas falas, às voltas com a etiqueta e as normas travadas do Vaticano.

Mas quem mais brilha em toda essa trama é aquele que não quer ser Papa, o cardeal interpretado por Michel Piccoli. Aos 86 anos, semblante suavizado pela passagem do tempo, o ator fetiche de Buñuel causa arrepios com sua interpretação de carne e osso. Humano, muito humano é o Papa de Moretti que Piccoli realiza com beleza e suavidade.

Frente a um mundo conturbado e difícil, eleito quase que à sua revelia, esse homem simples e sincero, recusa o que sabe que não é para ele. Rara qualidade nesse mundo de poderosos sem auto-crítica e pouco respeito pelo cargo que ocupam.

Seu contraponto, o porta-voz do Vaticano, papel de um ótimo Jerzy Stuhr, mostra a bizarrice que acontece quando tudo não corre como se prevê.

Nanni Moretti realiza, mais uma vez, um filme pouco comum. Faz rir com sobriedade. E é comovente o silêncio que se instala na platéia frente a um final obrigatório.

Vá você também admirar esse filme que é uma lição de humildade e sabedoria.


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