quarta-feira, 27 de junho de 2012

Para Roma com Amor









“Para Roma com Amor”- “To Rome with Love”, Estados Unidos/ Itália/ Espanha, 2012

Direção: Woody Allen



Em Roma, faça como os romanos, diz o ditado. Eu diria que Woody Allen sempre faz tudo do jeito dele, seja em Nova Iorque, São Francisco, Londres, Barcelona, Paris ou Roma.

Ele sabe o que dizer sobre a natureza humana, de uma forma pessoal, com uma graça irresistível. E, se Woody Allen é engraçado de um jeito que seus fãs adoram, talvez seja preciso ensinar a apreciar seu senso de humor sofisticado aos que ainda não o conhecem.

“Para Roma com Amor” recebeu críticas tanto elogiosas quanto azedas. Compreende-se. Depois de “Meia Noite em Paris” que agradou todo mundo, ganhou o Oscar de melhor roteiro e faturou U$151 milhões de dólares, os críticos querem mais do mesmo.

Mas Woody Allen surpreende sempre. E volta a filmar como ator, sendo ele mesmo, um homem de 76 anos, que mora em Nova Iorque e está sempre insatisfeito.

Ele faz um produtor de óperas aposentado, que não se conforma que a vida já tenha lhe oferecido o melhor e que inventa outros meios de se reassegurar de seu próprio valor. O tipo que ele criou dessa vez, brinca com a ideia de que todos somos geniais. Basta encontrar o ambiente certo.

Observar a natureza humana e compreender suas motivações é outra característica presente em filmes de Woody Allen. Em “Roma”, essa tarefa fica a cargo de Judy Davis que faz a psiquiatra casada com Woody Allen, que vive interpretando o marido e um arquiteto maduro (Alec Baldwin), que é uma espécie de “Grilo Falante” para um jovem arquiteto (Jesse Eisenberg) que se apaixona por uma garota (Ellen Page), que é atriz, amiga de sua mulher, narcisista ao extremo e especialista em frases recheadas de clichês.

Roberto Benigni, perseguido pelos “paparazzi”, é a celebridade do momento. O que ele fez para isso? Nada. Foi escolhido ao acaso. Incarna os famosos “15 minutos de fama” de que falava Andy Warhol, no fim do século passado.

Apreciador da beleza feminina, Woody Allen traz de novo às telas, Penélope Cruz, sua musa em “Vicky Cristina Barcelona”, que encanta em seu único vestido vermelho, decotado e curto, fazendo a prostituta com inteligência emocional acima da média.

Há outros personagens, todos caminhando pelas belezas de Roma, as praças com chafarizes e fontes, os muros antigos, ruínas de uma arquitetura milenar contrastando com o contemporâneo.

E sol, boa comida em mesas na calçada ou nos pátios e varandas das casas romanas e música. A trilha sonora de “Para Roma com Amor” vai de “Volare” e “Ciribiribin” a “Nessun Dorma”. Italianíssima!

E a gente sai leve do cinema, ainda se lembrando e rindo das passagens preferidas e torcendo para que, no ano que vem, Woody Allen apareça novamente em um filme que vamos adorar de novo. Ele é um mestre.

domingo, 17 de junho de 2012

A Primeira Coisa Bela



“A Primeira Coisa Bela”- “La Prima Cosa Bella”, Itália, 2010

Direção: Paolo Virzi



Nem começaram as imagens e já se escuta um locutor entusiasmado pedir palmas do público para a Miss Pancaldi 1971, praia conhecida de Livorno.

E quando vemos a primeira cena, onde moços, velhos e crianças estão ao redor de um palco improvisado, admirando as candidatas à mais bonita mãe daquele verão, ouvindo alguém cantar uma música romântica italiana, sentimos saudades de nós mesmos.

Porque houve um tempo em que íamos ao cinema ver comédias italianas. Os que tem mais de 50 anos, claro.

Era uma outra época, que o cinema revive como se fosse hoje, saudoso de si mesmo, em “A Primeira Coisa Bela”.

Esse é um dos maiores charmes dessa comédia, como só os italianos sabem fazer.

Faz tempo que não víamos a esperada mistura de risos e choro, acompanhados de gritos e palavrões, que não ofendem e fazem graça.

Tipos caricatos e, ao mesmo tempo, tão de carne e osso, gente mal educada e também tão gentil e carinhosa. E disposta a paixões fatais.

E o centro de tudo é sempre a família, onde se vivem os pequenos e grandes dramas, de onde se foge e para onde sempre se volta.

E nesse filme, o foco está na família de Anna Michelucci (Micaela Ramazzotti), eleita a Miss Mãe do Verão 1971, que terá sua história contada com idas e vindas no tempo. Um roteiro envolvente, escrito por um diretor talentoso, Paolo Virzi, 48 anos, herdeiro da tradição da comédia italiana.

Não é por acaso que um dos pais desse gênero de filme, Dino Risi (1916-2008) que fez “Perfume de Mulher” 1974, aparece sentado numa cadeira de diretor, em meio a figurantes de um filme dos anos 70.

E que Anna, quando mais velha, seja Stefania Sandrelli. Quem, com uma certa idade, não se lembra dela nos filmes de Pietro Germi, “Seduzida e Abandonada”1964 e em “Divórcio à Italiana”1961? Ou dirigida por Bernardo Bertolucci em “Novecento”1976? Ou ainda nos filmes de Mario Monicelli, Ettore Scola, Lina Wertmuller, Roberto Benigni, os grandes nomes do cinema italiano do século XX? Ela é uma lenda viva.

Parece que Paolo Virzi procura, com “A Primeira Coisa Bela”, a linguagem quase perdida com a nova Itália de Berlusconni.

E ela é reencontrada, porque nunca morreu de fato, nessa história em torno à Anna Michelucci, bela morena simpática e falante, casada com um tipo mal humorado e machista, que ela adora.

Será expulsa de casa com dois filhos pequenos (Giacomo Bibiani e Aurora Franca). E, apesar da vida difícil, que faz de Bruno (Valerio Mastrandea) um adulto triste, que se droga e que não sabe ainda de onde vem sua infelicidade e de Valeria (Claudia Pandolfi), uma moça-velha, desiludida e insegura, ambos vão amar para sempre aquela mãe carinhosa que tem a mania de cantar nos momentos difíceis.

Podemos até pensar que a “mamma” italiana pode ser, nesse filme, uma metáfora sobre a Itália alegre e bela, terra lendária e também “A Primeira Coisa Bela”, a mãe da infância que todos tivemos um dia, e que quase desaparece nos duros embates da vida. Reencontrá-la, lá dentro de nós mesmos, é descobrir de novo o prazer de viver.

Quando vocês forem saindo do cinema, já nos créditos finais, prestem atenção à canção que fala de um sorriso apaixonante, cantada por Malika Ayase, com ternura e charme.

E torçam para que o cinema italiano ressurja com força, para nos encantar sempre, como fazia antes.


quinta-feira, 14 de junho de 2012

Prometheus







“Prometheus”- Idem, Estados Unidos, 2012

Direção: Ridley Scott





Um cenário de pesadelo mais do que de sonho... Uma nave imensa sobrevoa o lugar. Que planeta estranho é esse?

Uma figura com manto e capuz, aproxima-se da grande cascata de águas negras e revoltas que se lança com fúria no abismo. Seu rosto branco e inexpressivo lembra o de uma estátua grega. O corpo enorme mostra músculos bem torneados mas ele não é feito de carne e osso.

A nave em forma de disco se inclina e sobe.

A figura estatuesca bebe uma espécie de geleia e começa a desintegrar-se. Entramos com a câmara em seu corpo e vemos células brilharem. O corpo cai nas águas escuras. Mergulhamos com ele.

Lá no fundo, uma estranha forma vermelha pulsa e brilha. Dentro ou fora da carcaça? 

Assim começa “Prometheus”, o novo Ridley Scott que volta à ficção científica que o tornou famoso em 1979, com “Alien – O Oitavo Passageiro” e depois “Blade Runner” em 1982.

“Prometheus” é uma introdução a “Alien”?

Alguns pensam que sim, já que o filme se passa 30 anos antes em 2093. E mais, se vocês se lembrarem, a tripulação da nave “Nostromo” de “Alien”, encontra, no planeta em que pousam, uma nave com um piloto muito parecido com a figura do início de “Prometheus”, com um buraco no peito, de onde parece que algo saiu com violência. O “Space Jokey” como ficou conhecido.

Já “Prometheus” conta a história de uma nave que parte da Terra para um planeta distante, guiada pela teoria de dois cientistas, Elizabeth Shaw e Charlie Holloway (Noomi Rapace da versão sueca de “Millenium”e Logan Marshall-Green). Baseados em escavações arqueológicas de diferentes culturas e pesquisas de DNA, deparam com um mesmo enigma que eles querem decifrar: a raça humana teria sido criada por seres de outro planeta, que eles chamam de “Os Engenheiros”?

Essa expedição tem, portanto, perguntas filosóficas tão importantes quanto antigas: quem somos, de onde viemos, quem nos criou?

Outros temas que aparecem mas são pouco desenvolvidos, tornariam o filme mais claro porque seriam discutidas as motivações dos personagens que tripulam a nave, dando mais corpo e alma a eles. Aliás “Prometheus” peca por apresentar personagens dos quais sabemos muito pouco.

Charlize Theron, sempre uma presença marcante, faz a filha do investidor do projeto que chefia a expedição. Fria e sarcástica.

Na verdade, o filme tira o fôlego do espectador pela beleza das cenas filmadas em um 3D, que aqui é indispensável. Tudo é enorme e espantoso. A fotografia empolga. E esse é o ponto forte do filme.

Uma cena ficará na nossa lembrança pela força do seu encantamento e originalidade: a recriação holográfica do universo, quando o robô David aciona os controles da nave extra-terrestre, lembrando “a música das esferas” de que falava Pitágoras, ou seja, a ideia de que os astros, ao se moverem, gerariam sons.

O filósofo e matemático grego pensava que haveria uma música cósmica que nos abriria para novos graus de compreensão. “Os Engenheiros” usavam esse tipo de conhecimento?

Sabe-se que onde há luz há sombras, mas como entender as figuras titânicas dos dois filmes, que explodem de dentro para fora dando nascimento ao monstro que representa a morte e o mal? Ou isso precisa ser compreendido de outra maneira?

Noomi Rapace faz a mulher frágil/forte e muito feminina que vai continuar a busca da resposta ao enigma da criação da raça humana.

Numa alusão divertida à tenente Ripley, papel da atriz estreante na época, Sigourney Weaver, que em “Alien” leva com ela o gato ao abandonar a nave, em “Prometheus”, a dra Elizabeth leva com ela o robô David, interpretado por Michael Fassbender, ator esplêndido em tudo que faz. Ele é o personagem mais intrigante do filme e parece saber mais sobre “os Engenheiros” do que os outros tripulantes da nave.

Haverá continuação como aconteceu com “Alien”?

Aliás nenhuma delas foi dirigida por Ridley Scott e nunca chegaram aos pés da qualidade do primeiro filme dirigido pelo diretor inglês.

Ou o enigma da criação do homem pelos “Engenheiros” permanecerá para sempre um mistério?

Só Ridley Scott poderá responder a essa questão.

E, ao que sabemos, ele se prepara para rodar um filme sobre o personagem bíblico Moisés, quando ele ainda era um príncipe do Egito.

Paciência. E pensar que ele levou 30 anos para voltar à ficção científica depois de “Blade Runner”...



sábado, 9 de junho de 2012

Branca de Neve e o Caçador







“Branca de Neve e o Caçador”- “Snow White and the Huntsman”, Estados Unidos, 2012

Direção: Rupert Sanders



Preparem-se. A história de Branca de Neve foi repaginada da cabeça aos pés.

Esqueçam a mocinha do conto dos irmãos Grimm de 1812, do desenho animado de Disney de 1937 e do filme “Espelho, Espelho Meu” que acabamos de assistir, dirigido pelo indiano Tarsem Singh.

Nessa releitura da história infantil mais famosa de todos os tempos, só os adultos são bem vindos. A recriação em tons escuros, as cenas assustadoras e os figurinos “dark”, não são para criancinhas.

A começar pela madrasta, a malévola e bela Ravenna (Charlize Theron, em momento pérfidamente brilhante), que se veste com asas de corvos e com o couro preto das roupas fetichistas e usa uma negra coroa pontiaguda que combina com o seu olhar penetrante e letal. Ela é uma mistura de bruxa com vampira que, para conservar a beleza eterna, precisa sugar a vida de muitas jovens donzelas.

Nesse estado de coisas, Branca de Neve (Kristen Stewart, a Bella de “Crepúsculo”) é um impecilho para a madrasta má, não só porque é a mais bela mas porque é a herdeira carismática do trono usurpado às custas de um assassinato real, cometido por Ravenna. Ela precisa do coração puro de Branca de Neve para conquistar plenamente o reino.

A beleza e a juventude não valem nada sem o poder absoluto, acredita essa rainha tão parecida com todos os tiranos de ontem e de hoje.

Mas Branca de Neve também não é mais aquela. À altura do mal que tem que enfrentar, ela está qual uma Santa Joana D’Arc, vestida em sua armadura brilhante e cavalgando entre seus soldados fiéis, para reaver o trono do pai.

Os famosos sete anões são agora oito e, recriados por computador, são interpretados por atores de altura normal e caras conhecidas (Ian McShane, Toby Jones e Ray Winstone, entre outros). Também não são mais bonzinhos.

E o caçador do titulo do filme, vivido por um másculo Chris Hamsworth, tem um papel mais importante na história do que o príncipe encantado, que aqui não passa do filho de um duque, William (Sam Caftlin), que é amigo de infância de Branca.

Em uma das mais belas cenas do início do filme, os dois brincam debaixo de um enorme macieira branca de flores, cujos frutos futuros lembram a versão dos irmãos Grimm. Mas nem a maçã escapa. Agora além de envenenada, é também peluda.

Bem. A história de “Branca de Neve e o Caçador” tem ingredientes capazes de empolgar a quem gosta mais de um filme de ação que de histórias de amor.

Afinal, o próprio diretor, o estreante Rupert Sanders, de 41 anos, afirmou que o seu objetivo era tirar as teias de aranha desse conto secular.

E, provávelmente, ele está certo, porque o cinema é magia e permite todas as ousadias a quem sabe fazer bons filmes.


quinta-feira, 7 de junho de 2012

À Espera de Turistas









“À Espera de Turistas”- “Am Ende Kommen Touristen”, Alemanha, 2007
Direção: Robert Thalheim

Um trem chega a uma estação e vemos um jovem loiro, mochila nas costas, puxando sua mala de rodinhas.
“- Procuro o Auschwitz Museum”, diz para o chofer de táxi.
Ora, só de ouvir esse nome, um arrepio de horror cruza a mente de quem tem mais de 50 anos ou é mais jovem e minimamente informado, ou ainda, aqueles que conhecem famílias judias.
Auschwitz é o campo de fama trágica, visto em milhares de fotos e filmes da Segunda Guerra. O campo de concentração mais conhecido de todos, lugar de vergonha para a cultura ocidental, manchada para sempre com algo bruto, cru, inumano.
Auschwitz é sinônimo de horror, da tragédia do Holocausto, da matança sistemática de milhões de judeus pelos soldados nazistas. Culpados de nada. Pilhas de cadáveres, pelo simples fato de serem judeus.
Mas nada disso transparece no rosto bonito e sem emoções do jovem alemão Sven (Alexander Fehling), que veio à pequena cidade da Polonia para prestar um ano de serviço comunitário, já que ele decidiu não fazer o exército.
E não é só o jovem alemão que mostra desconhecimento do lugar onde ele pretende morar por um ano. Os outros estagiários do Museu também se comportam como se a juventude europeia não se sensibilizasse com o passado vergonhoso. Ou o desconhecesse.
Sven vai encontrar e servir de ajudante para um sobrevivente de Auschwitz, um senhor ranzinza e caladão (Ryszard Ronszewsky).
Ele é a memória viva de tudo o que aconteceu naquele lugar. E, por isso dá palestras aos jovens recém-chegados para trabalhar no Museu. E escuta:
“-Posso ver o seu número? “
Ele levanta a manga da camisa e mostra:
“- Está meio apagado, quase não dá pra se ver...” diz um dos jovens estagiários, sem a menor sensibilidade.
“- É...Eu não mandei retocar”, retruca o velho senhor com humor negro.
E Sven, que é hostilizado pelos poloneses por ser alemão, encontra Ania (Barbara Wysocka), a mocinha polonesa que fala a língua dele e é guia histórico do lugar onde nasceu.
Ela vai ser a guia de Sven para o passado. O caminho para a emoção pesada que, ali, todos querem evitar.
E Sven vai mudar por dentro. Para isso colabora a convivência com o velho senhor, obcecado pela reparação das malas deixadas pelas vítimas do campo e sua família simpática, que vive perto dali.
E esse parece ser o objetivo do filme que chega ao Brasil com cinco anos de atraso mas sem perder a atualidade.
Através de imagens que parecem sair de uma velha câmara, com cores saturadas e um distanciamento proposital, “À Espera de Turistas” pretende educar sem grandes discursos. Fazer pensar através das situações humanas vividas pelos personagens. Refletir sobre uma tragédia que ocorreu há 70 anos atrás mas, que deve ser conhecida pelas novas gerações, para não ser jamais repetida.
É duro, pesado, mas esse horror que aconteceu tem que ser encarado para ser lembrado e servir de lição sobre o que podem fazer seres humanos quando se embrutecem, enlouquecem e esquecem que todos somos iguais e que devemos nos respeitar uns aos outros, sempre.


sábado, 2 de junho de 2012

Um Verão Escaldante











“Um Verão Escaldante”- “Um Été Brulant” França / Itália / Suiça, 2011

Direção: Philippe Garrel



Não é só o verão que pode ser escaldante. Em certa etapa da vida, os sentimentos tem uma temperatura bizarra. Incompatíveis com a calma que deve ter a respiração, sufocam.

Às vezes oscilam entre o gelado e o incandescente com tanta rapidez e força que o chão falta, vem a vertigem e a vontade de viver se abala.

Os amores da juventude podem ser incontroláveis e, quando vividos por pessoas autodestrutivas, podem ser mortais.

É disso que trata Philippe Garrel, herdeiro da “nouvelle vague” francesa, no seu novo filme, em que contracenam o belo Louis Garrel, filho do diretor e a sensual Monica Belucci, italiana com físico de deusa greco-romana.

Ela é a “femme fatale”, casada com Fréderic, que a ama como se ela fosse sua razão de viver. Mas Angèle é volúvel e ama o amor. Deseja ser desejada. E, com isso atiça o ciúme de Fréderic, um jovem “blasé”, entediado e ao mesmo tempo passional. Perdido, culpa sua mulher pela própria insegurança e falta de objetivos na vida.

Eles moram na Itália, em um cenário seco e, ao mesmo tempo, idílico. O dentro contrasta com o fora. Canapés de veludo e sombras versus um terraço ensolarado, de onde se avistam muros seculares e árvores antigas.

E, quando chegam Paul (Jérôme Robart) e Elizabeth (Céline Sallette), amigos franceses, está montada a cena para que a tragédia tenha testemunhas.

A câmara de Garrel, propositalmente, aparece no meio dos personagens quando eles já falaram o que tinham que falar. Daí os muitos silêncios eloquentes que expressam o clima pesado.

Jovens intelectuais que são, Paul e Fréderic falam muito sobre política e arte, mas não concordam em nada. Fréderic é alguém que pinta sempre os mesmos quadros e pensa que já viu tudo. Paul, idealista mas pé no chão, distribue um jornalzinho comunista e trabalha como simples figurante no cinema para ganhar algum dinheiro. E ama Elizabeth enfrentando as complicações que aparecem, com um amor mais maduro e compreensivo com as carências dela.

Atores convincentes, direção segura, bela iluminação e drama que interessa a quem gosta de observar o ser humano. Assim é “Um Verão Escaldante”. Mesmo assim o filme divide a crítica.

Eu acho que a própria crítica perde muitas vezes o rumo e não entende um filme diferente dos habituais.

Zanin, que eu admiro, em seu “Diário de Veneza”, elogia Garrel, que diz ser um dos poucos naquele festival que entende de fazer cinema e malha a parte do público que o vaiou em Veneza:

“Não é apenas a qualidade dos filmes que despenca. É, sobretudo, a qualidade dos espectadores que está abaixo da crítica. Obs.:a sessão em que isso aconteceu era reservada a profissionais de imprensa e da indústria cinematográfica.”

Não faça como eles. Vá ver “Um Verão Escaldante”, se você é daqueles que gostam de um produto diferente dos “block busters” que cansam os espectadores mais sofisticados.